DIREITOS HUMANOS

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Suspeitas de trabalho análogo à escravidão em construção de fábrica da BYD na Bahia

(Arquivo) Logo da BYD na Feira Automotiva de Pequim, em 25 de abril de 2024. PEDRO PARDO / AFP

AFPRio de Janeiro (BRA)

Mais de 160 trabalhadores chineses foram resgatados “em condições análogas à de escravos” no canteiro de obras de uma fábrica da gigante de carros elétricos BYD em Camaçari, na região metropolitana de Salvador (BA), informaram as autoridades locais.

A filial brasileira da montadora chinesa, BYD Auto do Brasil, anunciou, em nota, na noite de segunda-feira, dia 23, que rescindiu com efeito imediato o contrato da empresa terceirizada responsável pela obra, a Jinjiang Construction Brazil Ltda.

O local em questão fica em Camaçari, no estado da Bahia, onde está em construção a maior fábrica de carros elétricos da BYD fora da Ásia.

As obras foram suspensas em parte do canteiro por determinação do Ministério Público do Trabalho (MPT) da Bahia.

Desde novembro, o MPT, juntamente com outras agências governamentais, realizou verificações que levaram à identificação de “163 trabalhadores em condições análogas à de escravidão na empresa terceirizada Jinjiang, uma prestadora de serviços para a BYD”.

Um porta-voz do MPT disse à AFP, nesta terça-feira, dia 24, que todos os trabalhadores resgatados eram chineses.

No comunicado, o MPT denunciou “um quadro alarmante de precariedade e degradância” para os trabalhadores.

Em um dos alojamentos, os trabalhadores “dormiam em camas sem colchões e não possuíam armários para guardar seus pertences pessoais, que ficavam misturados com materiais de alimentação”, acrescentou.

O MPT reportou que a “situação sanitária era especialmente crítica, com apenas um banheiro para cada 31 trabalhadores, forçando-os a acordar às 4h para formar fila e conseguir se preparar para sair ao trabalho às 5h30”.

Durante a obra, os “trabalhadores estavam expostos a intensa radiação solar, apresentando sinais visíveis de danos à pele”.

O MPT também informou suspeitas de “trabalho forçado”, já que os trabalhadores da China “tiveram seus passaportes retidos” e seu empregador confiscava “60% de seus salários”, ficando com os operários “apenas 40% em moeda chinesa”.

Segundo o MPT, uma audiência foi marcada “para que a BYD e a Jinjang apresentem as providências necessárias à garantia das condições mínimas de alojamento e também para que sejam negociadas as condições para a regularização geral do que já foi detectado”.

A BYD Auto do Brasil garantiu que “não tolera o desrespeito (…) à dignidade humana” e disse que transferiu os 163 trabalhadores para hotéis da região.

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Brasil e Mundo

Massacre de Paraisópolis completa cinco anos sem punições

Paraisópolis, favela da zona sul paulistana, Foto: Espaço do Povo Paraisópolis

Famílias fizeram ato para marcar a data

Letycia Bond – Repórter da Agência Brasil

O Massacre de Paraisópolis completa cinco anos neste domingo (1º), sem a definição de uma pena para os responsáveis pela morte de nove jovens e como apenas um dos casos da violência policial que ainda se perpetua. Essa é a avaliação das famílias das vítimas, que realizaram um ato para marcar a data, em frente a um dos portões de acesso ao Palácio dos Bandeirantes, sede do governo de São Paulo.

O ciclo foi lembrado também com o lançamento de um site, que contém a linha do tempo do caso e hospeda uma central de denúncias. No site, também há relatórios que esmiuçam o episódio e abordam a questão da violência policial e a criminalização do funk.

Os manifestantes do ato de hoje percorreram a Rua Nabih Assad Abdalla, no Morumbi, com faixas que pediam paz e que continham outras mensagens, como “O Direito existe para que a justiça seja feita” e “Não foi socorro”, que rebate a versão da Polícia Militar (PM) de que os agentes foram acionados e chegaram ao Baile da DZ7, em 2019, para prestar socorro e não para atuar como força de repressão. Nos dois portões do palácio, foram feitos bloqueios por agentes da corporação, neste domingo.

Em sua fala, Cristina Quirino, mãe de Denys Henrique Quirino, destacou que ela e os demais familiares dos jovens mortos pela PM reclamam não só a punição dos policiais, mas também de quem dá as ordens e os orienta em relação ao que é aceitável ou não quanto à conduta que adotam em serviço.

“Não é só quem aperta o gatilho, quem joga o gás lacrimogêneo, quem executa. Quem manda também tem que ser punido”, declarou, ao microfone, após pausas em meio ao choro.

“É por isso que a gente tem aqui mães [de vítimas] de outros casos, que não o de Paraisópolis”, observou. “Os governadores não são punidos.”

Denys Henrique Quirino era uma das nove vítimas que morreram durante uma operação realizada durante o Baile da DZ7, de funk, na favela de Paraisópolis, em 2019. Ao todo, 12 policiais foram acusados de cometer os homicídios e um 13º responde por expor as pessoas do baile a risco, já que teria soltado explosivos em meio à multidão que se aglomerava e, com isso, agravado a situação.

A primeira audiência de instrução, no Tribunal de Justiça de São Paulo, ocorreu somente ao final de julho de 2023. Havia 24 testemunhas de acusação na lista de depoimentos programados, de um total de 52 testemunhas arroladas.

Em meados de dezembro de 2023, as audiências foram retomadas. Uma das principais perspectivas apresentadas à corte foi a da biomédica do Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (Caaf) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Ana Paula de Souza Velloso, que demonstrou, mediante evidências científicas, que as vítimas morreram por asfixia mecânica, não por pisoteamento .

A Defensoria Pública de São Paulo chegou a detalhar o caso em um relatório de 187 páginas, destacando a análise de imagens captadas por câmeras e conversas que revelam o modo como os policiais agiram na ocasião. O órgão afirmou que há sólidas evidências de que os agentes encurralaram jovens em uma viela da comunidade e que as vítimas morreram por asfixia, não por terem sido pisoteadas, como sustentam.

João Doria era o governador do estado, à época do massacre. Ele disse que não iria recuar nos comandos dados às forças de segurança pública, mesmo após inúmeras denúncias de abuso praticados por agentes.

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Brasil apresenta compromissos para eliminar violência contra criança

Violência contra crianças © Elza Fiuza/Arquivo Agência Brasil

Ações preveem reforço da segurança escolar e combate à discriminação

Luciano Nascimento – Repórter da Agência Brasil

O Brasil reafirmou perante a comunidade internacional oito compromissos pela eliminação da violência contra crianças. Os compromissos foram apresentados pela ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, ao participar, na última quinta-feira, dia 7, da 1ª Conferência Ministerial Global para o Fim da Violência contra a Criança, em Bogotá.

Entre os compromissos divulgados pelo governo brasileiro estão o desenvolvimento de um protocolo nacional unificado para atender crianças e adolescentes vítimas de violência, incluindo aquelas que ocorrem em ambiente digital; o fortalecimento de iniciativas de segurança escolar e prevenção contra discriminação e discurso de ódio – além do diálogo entre níveis governamentais e diversos setores sociais para difundir a prevenção da violência contra esse segmento social.

Em relação ao desenvolvimento de um ambiente digital seguro, o Brasil se comprometeu a aprimorar métodos de verificação etária e proteção de dados, além de apoio universal para pais e cuidadores.

Também foram pactuadas ações voltadas para a prevenção ao uso de substâncias ilícitas, violência e criminalidade – com foco em proteção social e prevenção de homicídios em territórios periféricos. Todas as ações serão monitoradas e relatadas anualmente no Plano Plurianual 2024-2027.

Cerca de 200 países participam da conferência. Ao longo do evento, os países apresentam as posições de seus governos em sessões de compromissos nacionais. Na ocasião, a ministra reafirmou o compromisso brasileiro com a proteção de crianças e adolescentes por meio de compromissos e iniciativas coordenadas para fortalecer a segurança, a proteção e o cuidado integral.

Entre os principais objetivos da Conferência Ministerial Global para o Fim da Violência contra a Criança, que termina nesta sexta-feira (8), está a redefinição, das ambições coletivas para concretizar a meta da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável (ODS 16.2) de que todas as crianças vivam livres da violência.

A expectativa é de que, ao fim, os países signatários da Conferência emitam o documento Chamada para a Ação, também conhecido como Declaração de Bogotá.

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Estudo aponta redução de 14,6% no trabalho infantil no Brasil, em 2023

Trabalho infantil, criança no sinal© Valter Campanato/Agência Brasil

Desafio é eliminar todas as formas de trabalho infantil até 2025

Daniella Almeida – Repórter da Agência Brasil

O Ministério do Trabalho e Emprego apresentou nesta terça-feira (5) estudo preliminar sobre a situação do trabalho infantil no Brasil. O levantamento aponta queda de 14,6% no índice em 2023, em comparação com o ano anterior.

O estudo Diagnóstico Ligeiro do Trabalho Infantil – Brasil, por Unidades da Federação considera os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Apesar da diminuição geral, o coordenador nacional de Fiscalização do Trabalho Infantil do MTE, Roberto Padilha Guimarães, ressaltou, em nota, que o cenário ainda é preocupante. “Essa realidade exige que continuemos fortalecendo as políticas públicas de prevenção e combate ao trabalho infantil.”

O Brasil pretende alcançar a meta 8.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). O desafio é, até 2025, acabar com o trabalho infantil em todas as suas formas, em todo o território brasileiro.

Dados do trabalho infantil

No Brasil, em 2022, havia 1,88 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade que trabalhavam em atividades econômicas ou na produção para o próprio consumo. Em 2023, o contingente em situação de trabalho infantil baixou para 1,607 milhão.

A série histórica da Pnad Contínua/IBGE para a população em situação de trabalho infantil foi a seguinte: 2016 (2,112 milhões), 2017 (1,945 milhão), 2018 (1,905 milhão), 2019 (1,758 milhão). Devido à pandemia de covid19, não foi possível coletar informações sobre o trabalho de crianças e adolescentes em 2020 e 2021.

De acordo com o estudo, em 2023, houve redução do trabalho infantil em 22 das 27 unidades da federação. As exceções são Tocantins, com alta de 45,2%; Distrito Federal, crescimento de 32,2%; Rio de Janeiro (+19,7%); Amazonas (+12%) e Piauí (+6%).

Minas Gerais e São Paulo lideram em números absolutos de crianças e adolescentes em trabalho infantil, com 213.928 e 197.470 menores de idade, respectivamente. Nesses estados também se concentram 25% das crianças e adolescentes encontradas nas piores formas de trabalho infantil de todo o Brasil.

Já as reduções no número de pessoas de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil foram verificadas, em 2023, no Amapá e no Rio Grande do Norte, com os maiores percentuais de diminuição (-51,6%).

Estes são seguidos por Acre, com queda de 43%; Santa Catarina (-31,8%); e Espírito Santo (-31,4%), que completam a lista dos cinco estados com as reduções mais expressivas.

Canais de denúncias

O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania dispõe do Disque 100, para receber denúncias, entre outras, sobre a ocorrência de trabalho infantil. O serviço funciona diariamente, 24 horas, por dia, incluindo fins de semana e feriados. As ligações podem ser feitas de todo o Brasil por meio do telefone 100. A ligação telefônica de aparelho fixo ou celular é gratuita e os dados são sigilosos.

 

 

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Brasil e Mundo

Quase 90% dos mortos por policiais em 2023 eram negros, diz estudo

O movimento de familiares de vítimas de violência policial do estado do Rio de Janeiro faz ato, em frente ao Palácio Guanabara, para protestar contra as operações letais que ocasionaram mais de 100 vítimas no estado – Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Pesquisa destaca peso do racismo na segurança pública

Rafael Cardoso – Repórter da Agência Brasil

Estudo publicado nesta quinta-feira, dia 7, pela Rede de Observatórios da Segurança mostra que 4.025 pessoas foram mortas por policiais no Brasil em 2023. Em 3.169 desses casos foram disponibilizados os dados de raça e cor: 2.782 das vítimas eram pessoas negras, o que representa 87,8%.

Os dados do boletim Pele Alvo: Mortes Que Revelam Um Padrão, que está na quinta edição, foram obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) em nove estados. Em todos eles, o padrão é de uma proporção muito alta de pessoas negras mortas por intervenção do Estado: Amazonas (92,6%), Bahia (94,6%), Ceará (88,7%), Maranhão (80%), Pará (91,7%), Pernambuco (95,7%), Piauí (74,1%), Rio de Janeiro (86,9%) e São Paulo (66,3%).

Para a cientista social e coordenadora da Rede, Silvia Ramos, os números são “escandalosos” e reforçam um problema estrutural do país: o racismo que atravessa diferentes áreas como educação, saúde, mercado de trabalho, mas que tem sua face mais crítica na segurança pública.

“O perfil do suspeito policial é fortalecido nas corporações. O policial aprende que deve tratar diferente um jovem branco vestido de terno na cidade e um jovem negro de bermuda e chinelo em uma favela. A questão é: 99,9% dos jovens negros das favelas e periferias estão de bermuda e chinelo. E todos passam a ser vistos como perigosos e como possíveis alvos que a polícia, se precisar, pode matar”, diz a pesquisadora.

Na análise por estados, a Bahia é a unidade da Federação com a polícia mais letal, com 1.702 mortes. Esse foi o segundo maior número já registrado desde 2019 dentre todos os estados monitorados. Na sequência, vem Rio de Janeiro (871), Pará (530), São Paulo (510), Ceará (147), Pernambuco (117), Maranhão (62), Amazonas (59) e Piauí (27).

“O que a gente vê na Bahia é uma escalada. Desde que a Rede começou a monitorar o estado, houve um aumento de 161% nas mortes. De 2019 a 2023, aconteceu o seguinte dentro da polícia baiana: em vez de coibir o uso da força letal, houve incentivo. Pode ter certeza, não é só porque os criminosos estão confrontando mais a polícia. É porque tem uma polícia cuja ação letal foi liberada”, diz a cientista social. “Se os policiais matam muito, recebem congratulações dos comandantes e incentivos institucionais, a tendência é que tipo de ação violenta seja cada vez mais incentivada”.

Juventude

O estudo também destaca que a juventude é a parcela da população mais vitimada pela polícia, principalmente na faixa etária entre 18 a 29 anos. E cita o Ceará como exemplo negativo, onde esse grupo representa 69,4% do total de mortos. Ainda mais grave é o dado que indica que, em todos os estados analisados, 243 das vítimas eram crianças e adolescentes de 12 a 17 anos.

Particularidades regionais

Alguns estados tiveram redução na letalidade policial. Caso do Amazonas, onde ocorreu queda de 40,4% e mudança na distribuição territorial das vítimas: a maioria das mortes foi no interior do estado. Maranhão, Piauí e Rio de Janeiro também apresentaram diminuição da letalidade em relação a 2022: 32,6%, 30,8% e 34,5%, respectivamente.

No Ceará e no Pará, foram registradas quedas mais discretas de mortes por intervenção do Estado: 3,3% e 16% respectivamente. Mas o número de vítimas negras aumentou em 27% no Ceará e em 13,7% no Pará.

Na Bahia, há uma crescente exponencial, com registro de três vítimas negras por dia em 2023. O número de vítimas aumentou em 16,1%. Pernambuco foi o estado que registrou o maior aumento no número de mortos, com 28,6% mais casos que em 2022. Já São Paulo quebrou o histórico de redução e aumentou em 21,7% os óbitos nas ações da polícia.

Dados ausentes

Pela primeira vez desde 2021, quando passou a integrar o estudo, o Maranhão forneceu dados de raça e cor de vítimas da letalidade policial. Mas de maneira incompleta: 5 a cada 7 vítimas não tiveram o perfil racial reconhecido, ou seja, a informação estava presente em apenas 32,3% dos casos.

O Ceará teve uma leve melhora, mas 63,9% das vítimas ainda não têm raça e cor reconhecidas. No Amazonas, esses são 54,2% dos casos. No Pará, os não informados representam 52,3%.

No total, 856 vítimas não possuem registros de raça e cor nos nove estados. Os organizadores do estudo reforçam a importância de que os governos sejam transparentes e incluam esses dados em 100% dos casos para uma análise qualificada da realidade. Desta forma, afirmam, o Poder Público poderá direcionar esforços para uma sociedade mais segura para todos.

Secretarias

A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com algumas das secretarias estaduais de segurança para se manifestarem sobre o estudo.

A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup) disse que tem “investido na qualificação dos agentes e em equipamentos tecnológicos que legitimam as ações de segurança, como o uso de 1.600 câmeras corporais (bodycams) por agentes. Além disso, foram adquiridos para as polícias Militar e Civil armamentos de incapacitação neuromuscular, visando a contenção sem risco de lesões graves”.

E que também tem sido implementadas políticas de inclusão social, como as nove Usinas da Paz, complexo multifuncional estadual com serviços gratuitos de promoção da cidadania e de combate à violência. A Segup atribui a essas iniciativas a redução de 15,89% nas Mortes por Intervenção de Agentes do Estado (MIAE) de janeiro a dezembro de 2023, na comparação com o mesmo período de 2022.

Já a Secretaria Estadual de Segurança Pública do Rio de Janeiro informou que se baseia nas estatísticas criminais oficiais produzidas pelo Instituto de Segurança Pública (ISP). E cita a categoria Letalidade Violenta, em que houve redução de 15% no acumulado e de 16% no último mês, em comparação com os mesmos períodos de 2023. A categoria, no entanto, junta em um mesmo grupo tipos de violência distintos, como homicídios dolosos, latrocínios (roubos seguidos de morte), lesões corporais seguidas de morte e mortes por intervenção de agentes do Estado. Disse ainda que “desconhece a metodologia utilizada na pesquisa e a possibilidade de rastreabilidade dos dados”. Acrescenta que “as mortes de criminosos em confronto aconteceram em decorrência de agressões praticadas contra agentes do Estado, que atuam visando a captura e a responsabilização dos mesmos”. E que a “instituição reforça que as ações priorizam sempre a preservação de vidas”.

De acordo com a Secretaria de Estado dos Negócios da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), “as mortes em decorrência de intervenção policial são resultado da reação de suspeitos à ação da polícia”. O órgão garante que todos os casos do tipo são investigados com rigor pelas polícias Civil e Militar, com acompanhamento das corregedorias, Ministério Público e Poder Judiciário. A SSP-SP disse estar investindo “continuamente na capacitação do efetivo, aquisição de equipamentos de menor potencial ofensivo e em políticas públicas”.

A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS) disse ter compromisso em “reduzir estigmas e a vulnerabilidade contra pessoas negras” e que dialoga com a Secretaria de Igualdade Racial (Seir) para articular ações de combate à discriminação. A pasta afirmou tratar “todas as mortes decorrentes de intervenção policial com seriedade e transparência”. Informou ainda que vai lançar em breve uma nova tecnologia para cruzar dados estratégicos dos inquéritos policiais e levantamentos da Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública (Supesp), assim como o perfil das vítimas de crimes. A secretaria garantiu que os profissionais da segurança pública participam de formações iniciais e continuadas para o atendimento humanizado às pessoas negras e demais grupos vulneráveis.

Os governos da Bahia e de Pernambuco não responderam até o momento.

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Brasil e Mundo

Brasil concedeu mais de 11 mil vistos de acolhida de migrantes de 2023 até julho de 2024

Afegãos, haitianos, ucranianos e sírios são nacionalidades com possibilidade de obter abrigo político e humanitário em território brasileiro

Agência Gov | via MRE

O Brasil concedeu 11,2 mil vistos de acolhida humanitária de janeiro de 2023 a julho de 2024. Os migrantes beneficiados são originários de países afetados por conflitos ou crises humanitárias, como o Afeganistão, o Haiti, a Síria e a Ucrânia.

A concessão dos vistos de acolhida é fruto de portarias interministeriais (PI) firmadas entre o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e o Ministério das Relações Exteriores (MRE). Os instrumentos têm o objetivo de proteger migrantes em situação de vulnerabilidade e assegurar a eles proteção e acolhimento no território brasileiro.

“O Brasil tem se destacado há décadas pela política assertiva de concessão de visto temporário e de autorização de residência para acolher humanitariamente nacionais de países afetados por conflitos ou crises humanitárias”, ressalta o coordenador-geral do Comitê Nacional para Refugiados, Pedro Henrique Cícero. O órgão colegiado é vinculado ao MJSP.

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De acordo com informações do DataMigra BI, os afegãos foram os que mais receberam vistos humanitários no Brasil: 6.149, de janeiro de 2023 a julho de 2024. Em segundo lugar, estão os haitianos, com 4.119, no mesmo período. Os sírios somam 926, e os ucranianos, oito. O DataMigra BI é a plataforma que reúne dados migratórios de diversos órgãos do Governo Federal. Ele é coordenado pelo Observatório das Migrações (Obmigra).

As medidas de acolhimento humanitário para os quatro países estão definidas nas PIs do MJSP e do MRE:

Afeganistão : a PI n° 42/2023 autoriza a concessão de visto temporário de residência para afegãos. O objetivo é proporcionar proteção a pessoas afetadas pela crise humanitária e política no Afeganistão, em especial após a retomada do controle daquele território pelo Talibã. Esse visto permite permanência legal no Brasil, com acesso a trabalho e integração social.

Haiti : a PI n° 37/2023 estabelece medidas para concessão de visto temporário e autorização de residência para haitianos em situação de vulnerabilidade. O Brasil reconhece a crise humanitária no Haiti, agravada por desastres naturais e pela instabilidade política.

Síria : a PI n° 9/2019 define a concessão de visto temporário e residência para sírios afetados pelo conflito armado no país de origem. A medida visa amparar refugiados e deslocados em razão da guerra civil na Síria. O Brasil oferece proteção humanitária ao permitir a permanência dessas pessoas no território brasileiro.

Ucrânia : a PI n° 36/2023 dispõe sobre a concessão de visto temporário e de autorização de residência para fins de acolhida humanitária aos nacionais ucranianos e aos apátridas afetados ou deslocados pela situação de conflito armado na Ucrânia.

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Em evento do manto sagrado, tupinambás pedem a Lula demarcações

© Fernando Frazão/Agência Brasil

Presidente criticou aprovação do marco temporal pelo Congresso

Por Rafael Cardoso – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

No evento final de recepção do manto sagrado tupinambá, indígenas cobraram ações para demarcação de terras e retirada de intrusos de territórios dos povos originários. O evento foi realizado nesta quinta-feira (12) no Museu Nacional, onde o manto está abrigado, e contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, e outros representantes dos governos federal, estadual e municipal.

A anciã Yakuy Tupinambá criticou os trâmites de devolução do manto e defendeu que seja alocado oficialmente no território tupinambá, na Bahia, e não no museu. Ela também criticou a tese do marco temporal e cobrou mais medidas de demarcação de terras indígenas.

“Reiteramos nossa insatisfação com a postura colonizadora personificada pelo Estado brasileiro, através das autarquias representativas que mais uma vez dilaceram nossos direitos originários e, muito mais que isso, fere profundamente o que mais prezamos: a nossa crença e a nossa fé”, disse Yakuy Tupinambá.

“Nossas reivindicações são: retorno do manto para aldeia mãe Olivença [município no litoral baiano], construindo um museu de arte tupinambá; exigimos o respeito e a garantia dos nossos direitos; autonomia do Ministério dos Povos Indígenas, reestruturação da Funai; anistia e reparação aos povos indígenas e africanos; não ao marco temporal, demarcação já!”, complementou.

Rio de Janeiro (RJ) 12/09/2024 – Indínegas do povo tupinambá de Olivença, na Bahia, participam da celebração do retorno do Manto Tupinambá ao Brasil, na Quinta da Boa Vista, onde fica o Museu Nacional. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Rio de Janeiro (RJ) 12/09/2024 – Povo tupinambá de Olivença, na Bahia, participa da celebração do retorno do Manto Tupinambá ao Brasil, no Museu Nacional. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O presidente Lula destacou que as pessoas podem reclamar na frente do presidente da República, do governo federal, o que não ocorria em governos anteriores, quando os indígenas sequer eram recebidos pelo presidente. Segundo ele, existe uma luta política difícil para avançar nos direitos dos povos originários e criticou a tese do marco temporal.

“Eu também sou contra a tese do marco temporal. Fiz questão de vetar esse atentado aos povos indígenas. Mas o Congresso Nacional, usando uma prerrogativa respaldada por lei, derrubou o meu veto”, disse Lula. “A maioria dos congressistas não tem compromisso com os povos indígenas. O compromisso deles é com grandes fazendas e grande proprietários”.

O presidente também afirmou que o governo tem colocado as questões indígenas como prioritárias e citou a criação do Ministério dos Povos Indígenas.

“Fizemos e continuamos a fazer a desintrusão de territórios ocupados por não indígenas. Homologamos novas terras e temos certeza que faremos muito mais. Sempre enfrentando desafios, que são muitos e precisam ser tratados de forma negociada, com diálogo e transparência”, afirmou.

Sobre o manto tupinambá, Lula defendeu que o Museu Nacional seja considerado como um abrigo temporário, e que sejam criadas condições para a transferência do objeto sagrado ao território indígena na Bahia.

“O manto está no Museu Nacional, mas espero que todos compreendam que o lugar dele não é aqui. Espero que todos compreendam, e eu tenho certeza que vamos ter a compreensão do nosso governador da Bahia, que disse que é tupinambá também. Ele tem a obrigação e o compromisso histórico de construir na Bahia um lugar que possa receber esse manto e preservá-lo”, disse o presidente.

Manto tupinambá

O manto tupinambá tem 1,80 metros de altura e milhares de penas vermelhas de pássaros guará. Estava guardado ao lado de outros quatro mantos no Museu Nacional da Dinamarca. Chegou a Copenhague em 1689, mas foi provavelmente produzido quase um século antes.

Artefatos tupis foram levados à Europa desde a primeira viagem portuguesa ao Brasil e o processo continuou ao longo das décadas seguintes, como evidências da “descoberta” do novo território e como itens valiosos para coleções europeias.

Outros dez mantos semelhantes, também confeccionados com penas de guará, continuam expatriados em museus europeus, segundo levantamento feito pela pesquisadora norte-americana Amy Buono, da Universidade de Chapman.

Apenas no Museu Nacional da Dinamarca, existem outros quatro além do que foi devolvido ao Brasil. No Museu de História Natural da Universidade de Florença (na Itália), existem outros dois. Há também mantos tupinambás guardados no Museu das Culturas, em Basileia (na Suíça); no Museu Real de Arte e História, em Bruxelas (na Bélgica); Museu du Quai Branly, em Paris (na França); e na Biblioteca Ambrosiana de Milão (na Itália).

A doação do manto foi anunciada em junho de 2023, depois de cerca de um ano de negociações entre as instituições do Brasil e da Dinamarca. A peça chegou ao Brasil no dia 11 de julho deste ano.

Um cronograma de celebrações foi organizado para o retorno do manto. Lideranças espirituais tupinambás e pajés fizeram atividades de acolhimento, proteção e bênçãos ao manto sagrado. Durante três dias, os indígenas ficaram em vigília nos arredores do Museu Nacional.

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Grito dos Excluídos completa 30 anos dando voz à resistência popular

Wilson Dias/Agência Brasil

Mais de 40 organizações participaram do ato em Brasília

Por Fabíola Sinimbú – Repórter da Agência Brasil – Brasília

Movimentos sociais, comunidades, grupos populares de diferentes lugares, religiões e que resistem nas mais diversas lutas ganharam as ruas em todo o país, para dar voz ao Grito dos Excluídos neste 7 de setembro. O movimento, que completa 30 anos, trouxe em 2024 a reflexão “Vida em primeiro lugar: todas as formas de vida importam. Mas quem se importa?”

Brasília (DF), 07.09.2024 – Grito dos Excluidos:

Brasília (DF), 07.09.2024 - Grito dos Excluidos:
Raimunda Nonata pediu atenção as demandas dos catadores de materiais recicláveis – Wilson Dias/Agência Brasil

A presidente da Associação de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis e Reutilizáveis do Cerrado, Raimunda Nonata de Souza e Silva, conhecida como Joelma, reforça que a vida dos catadores importa, por isso defende mais atenção às demandas desses trabalhadores.

“Nós salvamos a natureza, salvamos vidas, mas é preciso que nos enxerguem, que sejamos vistos nos nossos diretos, na saúde, que tenhamos um valor digno dos catadores. Hoje trabalhamos no sol, ganhamos o terreno do governo federal, mas precisamos de um galpão pra ter dignidade.”

Brasília (DF), 07.09.2024 - Grito dos Excluidos:
Pastora Wall Moraes defendeu maior representatividade das mulheres nos fundos eleitorais e partidários – Wilson Dias/Agência Brasil

A representante da Plenária Mulheres Negras na Política, pastora Wall Moraes deu voz ao debate sobre a representatividade feminina nos fundos eleitorais e partidários.

“Quero chamar a atenção de todos os movimentos e coletivos das cinco regiões brasileiras que de nada adianta aumentarmos as candidaturas de mulheres, as candidaturas de negras se elas não recebem o dinheiro público do fundo partidário e o fundo eleitoral, que 30% é para elas financiarem as suas campanhas”, reivindicou.

Segundo Vanildes Gonçalves dos Santos, representante do Centro de Estudos Bíblicos da Universidade Católica de Brasília, que integra a organização do movimento, em Brasília, mais de 40 organizações participaram este ano do ato. Na 30ª edição, a mobilização está sendo chamada pelos organizadores de Grito dos Excluídos, Excluídas e Excluídes.

Brasília (DF), 07.09.2024 - Grito dos Excluidos:
Vanildes Gonçalves dos Santos diz que mais de 40 organizações participaram do Grito dos Excluídos este ano – Wilson Dias/Agência Brasil

“É um grito que nasce dentro da Igreja Católica Apostólica Romana, da CNBB [Conferência Nacional dos Bispos do Brasil], da CRB [Conferência dos Religiosos do Brasil], mas que reúne em torno delas o movimento ecumênico, inter-religioso, social nesses anos todos de luta.”

Projeto para o Brasil

Criado na 2ª Semana Social Brasileira, promovida pela CNBB em 1994, o Grito dos Excluídos surgiu de uma reflexão da Igreja com os movimentos populares sobre a construção de um Brasil mais inclusivo

 “Ficou evidente que a pátria que celebra todos os 7 de Setembro não está sendo uma pátria capaz de incluir uma grande categoria de pessoas. O nosso país segue com uma profunda desigualdade no que se refere especialmente ao direito das pessoas à casa, ao trabalho, a uma terra para viver e a todos os direitos”, destacou o padre Dário Bossi, assessor da Comissão Episcopal para Ação Sociotransformadora da CNBB.

De acordo com Bossi, o Grito dos Excluídos representa um “projeto do Brasil que queremos”, construído a partir de uma unidade gerada por diversas expressões religiosas que se unem à causa dos movimentos populares e sindicatos. “A Igreja assume, com seriedade, o pedido que o papa Francisco fez para que haja um maior diálogo com os movimentos populares. O papa reconhece que os movimentos populares, mesmo não necessariamente inspirados por razões ou espiritualidade religiosa, têm uma carga de compromisso para o bem-estar do coletivo, para o bem comum, que precisa ser valorizado. O papa chama os movimentos populares de poetas sociais”, ressaltou.

Brasília (DF), 07.09.2024 - Grito dos Excluidos:
Grito dos Excluídos chega à 30ª edição – Wilson Dias/Agência Brasil

Bem viver

O Grito dos Excluídos é um dia dessa integração, que, segundo padre Dário, é contínua, a exemplo de iniciativas como o Projeto Popular Brasil que Queremos: o Bem Viver dos Povos, lançado dentro da programação da 6ª Semana Social Brasileira (2020-2024), em agosto passado.

O projeto chama à reflexão coletiva para a construção de iniciativas de afirmação da agroecologia, de convivência das comunidades com a seca, projetos urbanos, nas periferias urbanas, de cozinhas comunitárias, de combate à fome, de organização popular pelo direito à casa, projetos também que provocam e estimulam a reforma agrária, direito das comunidades e das famílias de terem uma terra onde trabalhar.

 “Essa ideia de um projeto popular é de fato dar voz às inúmeras iniciativas que existem na base, nas comunidades, nos territórios de nosso país e que tem valorizado a capacidade de as comunidades se organizarem, apesar, muitas vezes, como digo, da exclusão de que sofrem”, concluiu Bossi.

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Brasil e Mundo

Cerca de 400 mil medidas protetivas para mulher são expedidas por ano

© Bruno Peres/Agência Brasil

Governo federal lança campanha Feminicídio Zero

Por Douglas Corrêa – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

Ao lançar campanha pelo fim do feminicídio no país, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, destacou que o número de medidas protetivas expedidas no país chega a 400 mil por ano.

A campanha “Feminicídio Zero- Nenhuma violência contra a mulher” quer envolver toda a sociedade contra esse tipo de violência.

“O crime de feminicídio é um crime evitável. Ele é diferente dos outros crimes como homicídios, brigas de rua, por exemplo. Nós estamos querendo envolver toda a sociedade. Estamos fazendo articulações com várias empresas, grupos de mulheres do Brasil, clubes de futebol, porque nós queremos falar com os homens. O espaço do esporte é muito importante para que os clubes se mobilizem e passem mensagens para evitar a agressão e o abuso contra as mulheres, que são crimes”, disse a ministra Cida Gonçalves, em entrevista ao programa A Voz do Brasil, da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Denúncia

Nesta quarta-feira (7), data em que a Lei Maria da Penha completa 18 anos, a ministra convocou que as mulheres e a população denunciem os casos de violência. As denúncias podem ser feitas ao Ligue 180, de forma anônima. A polícia é acionada.

Pelo telefone, as mulheres podem ainda tirar dúvidas e receber orientação e informação. “Nós estamos preparadas para atender a todas as mulheres do país”, acrescentou. Em situação de emergência, a orientação é ligar para o número 190, quando a polícia será acionada.

“Você que está nos ouvindo, você que está em casa também nos ajude. A sua fala, o seu posicionamento vai fazer com que a gente de fato acabe com a violência contra as mulheres. Nós precisamos também dos homens. Nós precisamos que os homens digam para outros homens que a violência contra a mulher é crime”, afirmou.

Neste mês, foi lançado o Agosto Lilás, uma campanha de enfrentamento à violência doméstica contra a mulher.

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Brasil e Mundo

Ao menos 208 indígenas foram assassinados no Brasil em 2023

© Tânia Rêgo/Agência Brasil

Resultado mostra aumento de 15,5% em comparação a 2022

Por Alex Rodrigues – Repórter da Agência Brasil – Brasília

Ao menos 208 indígenas foram assassinados no Brasil ao longo do ano de 2023. O dado consta do relatório Violência Contra os Povos Indígenas, que o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) divulgou na tarde desta segunda-feira (22).

Este é o segundo pior resultado registrado desde 2014, quando o conselho, vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), passou a recorrer a dados oficiais para contabilizar homicídios de indígenas. A metodologia não leva em conta 17 homicídios que os autores do documento classificaram como culposos, ou seja, não intencionais.

O número de assassinatos no ano passado é inferior apenas ao registrado em 2020, quando 216 indígenas morreram de forma violenta – em um primeiro momento, o conselho chegou a divulgar que 182 indígenas tinham sido mortos naquele ano, mas a informação foi posteriormente corrigida.

Os 208 assassinatos em 2023 significam aumento da ordem de 15,5% em comparação ao número registrado em 2022 (180). O resultado vai na contramão da redução do número de homicídios no país. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os assassinatos diminuíram 3,4% em 2023, na comparação com 2022.

Os autores da publicação, contudo, destacam que, este ano, acessaram uma base de dados “mais completa e atualizada” para tabular os casos de assassinatos, suicídios, mortalidade infantil e mortes por desassistência à saúde entre indígenas, o que pode ter resultado em números mais altos, dificultando a comparação com anos anteriores.

Ainda de acordo com o Cimi, em 2023 os estados de Roraima (47), Mato Grosso do Sul (43) e Amazonas (36) encabeçaram o ranking das unidades da federação com maior número de assassinados. Juntos, esses três estados totalizam quase 40% dos homicídios registrados em 26 das 27 unidades federativas. A maioria (171) das vítimas tinha entre 20 e 59 anos e foram identificadas como homens (179), enquanto as demais 29 foram registradas como mulheres.

“O ambiente institucional de ataque aos direitos indígenas foi espelhado, nas diversas regiões do país, pela continuidade das invasões, conflitos e ações violentas contra comunidades e pela manutenção de altos índices de assassinatos, suicídios e mortalidade na infância entre estes povos”, acrescentam os responsáveis por elaborar o documento.

Os dados do anuário são compilados por equipes do próprio Cimi, a partir da base do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e de informações obtidas junto à Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). O Cimi contabilizou 203 óbitos por agressão contra indígenas em 2021; 216 em 2020; 196 em 2019; 135 em 2018; 110 em 2017; 118 em 2016; 137 em 2015 e 138 em 2014.

“As disputas em torno dos direitos indígenas no [âmbito dos] três Poderes da República refletiram-se, em 2023, em um cenário de continuidade das violências e violações contra os povos originários e seus territórios”, aponta o Cimi no relatório, acrescentando que o ano passado foi marcado por uma série de conflitos territoriais e assassinatos envolvendo brigas ou desavenças, muitas vezes potencializadas por bebida alcoólica.

Violações

O relatório do Cimi contém dados igualmente “preocupantes” relativos a outras formas de violência contra os povos indígenas no Brasil. De acordo com os dados, ao menos 670 crianças indígenas entre zero e 4 anos de idade morreram por causas evitáveis, ou seja, “em decorrência de enfermidades, transtornos e complicações que poderiam ter sido controladas por meio de ações de atenção à saúde, imunização, diagnóstico e tratamento adequado”. O relatório registra ainda que pelo menos 180 indígenas tiraram suas próprias vidas.

Em relação aos direitos territoriais, o Cimi registra 1.276 casos de violência, distribuídos entre os subtipos de ocorrência omissão e morosidade na regularização de terras (850); conflitos (150) e invasões, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio (276).

O relatório também denuncia o que tipifica como “violência por omissão do poder público”, destacando o que os autores classificam como casos de desassistência geral (66 ocorrências), além de episódios na área da educação escolar (61) e na saúde (100).

O Cimi critica a falta de sinalização clara do governo federal na defesa dos territórios indígenas, principalmente no tocante à indefinição quanto à aprovação da Lei nº 14.701, que estabelece o chamado marco temporal.

Pela tese, os indígenas só têm direito aos territórios originários que ocupavam ou já reivindicavam até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Pouco antes de deputados federais e senadores aprovarem a lei, o Supremo Tribunal Federal (STF) tinha apontado a inconstitucionalidade da tese apenas.

O que motivou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a vetar este ponto. Em dezembro, contudo, o Congresso Nacional derrubou o veto de Lula, mantendo o marco temporal.

A queda de braço entre Executivo e Legislativo foi judicializada por setores favoráveis e contrários à lei. Em abril, o ministro Gilmar Mendes, do STF, determinou a instauração de um processo de conciliação, suspendendo o julgamento de qualquer ação que trate do tema. A previsão é de que a comissão criada para tentar estabelecer um acordo entre as partes comece a funcionar no próximo dia 5 de agosto.

“A morosidade e a ausência de uma sinalização clara do governo federal em defesa dos territórios indígenas tiveram influência direta no alto número de conflitos registrados, muitos deles com intimidações, ameaças e ataques violentos contra comunidades indígenas”, apontam os autores do relatório, destacando que, de 1.381 terras e demandas territoriais indígenas existentes, 850 (ou 62%) seguem com pendências administrativas para sua regularização.

“Destas, 563 ainda não tiveram nenhuma providência do Estado para sua demarcação. Em 2023, os maiores avanços [em termos de políticas indígenas] ocorreram na constituição ou reestruturação de grupos técnicos (GTs) para a identificação e delimitação de terras indígenas, sob responsabilidade da Funai. É um indicativo da disposição do órgão em dar andamento à primeira etapa na regularização de demandas territoriais represadas há anos.”

O relatório indica, contudo, que os trabalhos avançam a passos lentos: “apenas três relatórios de identificação e delimitação foram concluídos e publicados pela Funai em 2023. E a indefinição sobre o marco temporal torna impossível uma previsão acerca do cumprimento dos prazos estabelecidos nas portarias, na medida em que o governo hesita e utiliza a Lei 14.701/2023 como justificativa para não avançar nos procedimentos demarcatórios”, conclui o Cimi.

Segundo a Funai, após seis anos de paralisação dos processos demarcatórios, o governo federal homologou, no ano passado, oito novas terras indígenas e a União destinou mais de R$ 200 milhões para ações de proteção e demarcação territorial. Além disso, cerca de R$ 5,3 milhões foram destinados ao pagamento de indenizações por benfeitorias a ocupantes de boa-fé retirados de terras indígenas.

Consultados, os ministérios dos Povos Indígenas; da Justiça e Segurança Pública e da Saúde informaram não ter tido acesso prévio ao relatório divulgado nesta tarde e que se manifestarão após analisar o documento.

Governo

Consultados, os ministérios dos Povos Indígenas e da Saúde informaram não ter tido acesso prévio ao relatório divulgado esta tarde e que se manifestarão após analisar o documento.

Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública informou que a Força Nacional de Segurança Pública tem atuado em terras indígenas, sob demanda, para auxiliar outros órgãos a manter a ordem pública e garantir a segurança e integridade patrimonial e das pessoas.

Ainda segundo a pasta, só no primeiro semestre deste ano, agentes da tropa federativa participaram de operações em 21 áreas indígenas de nove unidades federativas, incluindo ações de combate ao garimpo ilegal, remoção de não-indígenas, proteção dos recursos naturais, policiamento ostensivo e fiscalização ambiental.

Além das operações, a Força Nacional também trabalha na desintrusão das terras Yanomami, Karipuna, Arariboia, Kayapó, Munduruku, Uru-Eu-Wau-Wau e Trincheira Bacajá, esta última, já concluída e, atualmente, em fase de monitoramento da região e elaboração de um plano de sustentabilidade do território.

A nota do Ministério informa ainda que as desocupações correm no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, expedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro de 2023. A Suprema Corte homologou os planos operacionais de retirada de invasores dos sete territórios, destacando a necessidade de planejamentos semelhantes e adaptados à realidade de cada comunidade.

“Além disso a Secretaria de Acesso à Justiça (Saju) mantém diálogo constante com comunidades indígenas e com organizações como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), recebendo e articulando as demandas das populações dentro do MJSP e com outros órgãos do Governo Federal a fim de garantir a efetivação dos direitos dos povos indígenas”, concluiu a pasta.

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