Opnião

Imagine-se sem casa, sem teto

Poucas coisas podem ser mais tristes, avassaladoras ou trágicas do que não ter um teto onde morar, uma casa onde se abrigar, um lar onde desfrutar a grande aventura de viver. Todos os que têm uma morada sabem de sua importância e valor. Os seres humanos simplesmente não podem viver se um abrigo que os proteja das intempéries e dos perigos da vida ao relento.

Ninguém, em sã consciência, poria fogo em sua casa, ou a encheria de lixo, espalhando garrafas de refrigerante usadas e veneno pela sala, emporcalhando o quarto com restos de comida e plástico velho, ou a cozinha com resíduos de latas enferrujadas, galões de gasolina, pesticidas agrícolas e embalagens vazias de veneno.

Se tudo isso soa a loucura, é porque realmente o é. No entanto, é o que muitas vezes fazemos com nosso grande lar — o lindo planeta Terra. Temos jogado lixo em todas as partes; as praias ficam imundas depois de receberem os banhistas; rios, lagos e oceanos estão cheios de plástico e veneno, alguns a ponto de não mais sustentar a vida. Os recursos do planeta são imensos, mas limitados; mesmo assim, tratamos o meio ambiente com descuido e descaso. Estamos a inviabilizar nossa própria morada neste belo ponto azul do universo.

Colapso

Um dos mais destacados pensadores contemporâneos, Jared Diamond (*1937), vencedor do Prêmio Pulitzer (1998), escreveu um livro fundamental para compreendermos como os seres humanos têm inviabilizado sua própria existência através da destruição do meio ambiente; chama-se Colapso: Como as sociedades escolhem o fracasso ou sucesso.

Na obra, através da análise da autodestruição de várias civilizações do passado causada pelo descaso com o meio ambiente, o autor deixa uma mensagem clara: quem não compreende os erros do passado está destinado a repeti-los.

Ele também salienta a condição atual de deterioração do meio ambiente mundial causado pelo descaso e pelas decisões desastrosas de governos e povos, nos quais cada um de nós certamente toma parte ativa.

É uma leitura de fôlego, com certeza, mas fascinante em seus relatos, instigante em suas ideias, fundamental em suas conclusões e extremamente prazerosa em sua escrita fluida e elegante. Imprescindível para mentes curiosas e tomadores de decisões.

A Natureza como Fonte de Bem Leon Tolstói (1828–1910), o genial escritor russo, autor de Guerra e Paz, Ana Karenina e outras obras fundamentais da literatura mundial, certa vez escreveu: Uma das primeiras condições da felicidade é que a ligação entre o homem e a natureza não seja rompida.

O ser humano não é nada sem a Natureza. Ponto final. Todo nosso sustento provém da Natureza ao nosso redor, assim como provém dela a poesia, a arte, o desfrute, a beleza, o encantamento, a alegria fácil e perene. A Natureza é nossa fonte de Bem, tanto  físico quanto espiritual. Entretanto, na alucinada busca de conforto e lucro, temos permitido que os recursos naturais sejam dilapidados, violentados, envenenados   eliminados. Trafegamos diariamente ao longo de rios mortos (o Tietê, em São Paulo, logo vem à mente), de praias “impróprias para banhos”, de lixões montanhosos, de atmosferas impróprias para a respiração e não nos damos conta do desastre diante de nossos narizes. Tristíssimo. E perigoso.

Enfrentamos a terrível redução dos habitats naturais e suas consequências (como a atual pandemia); testemunhamos a redução do volume de peixes e crustáceos, fundamental fonte de alimento para a humanidade; sofremos a erosão e a deterioração dos solos, o aumentando sua fragilidade e a redução de sua capacidade de recuperação.

Provocamos a perda de diversidade biológica, com uma centena de espécies extintas e mais de mil ameaçadas de extinção. O crescimento ilimitado da população humana e o consumo alucinado de recursos impõe riscos imensos à vida humana no planeta. Temos limitações quanto à capacidade de geração de energia, à quantidade de água potável disponível e à capacidade de produzir alimentos de origem vegetal.

Temos os problemas com a produção de produtos químicos tóxicos, a liberação de gases na atmosfera e a introdução de espécies exóticas e destruidoras de habitats. Cada um dos problemas relativos ao meio ambiente está inter-relacionados a todos os outros, e tem as ações humanas como seus algozes. Os problemas são extremamente graves, e podem limitar a forma como viveremos em um futuro não muito distante. Temos que escolher, agora, entre a solução ou a catástrofe.

Natureza e Espiritualidade

No majestoso filme Derzu Uzalá (1975), do grande diretor japonês Akira Kurozawa (1910–1998), somos apresentados à contraposição entre a exploração materialista do meio ambiente e a sua preservação através de uma consciência espiritual. Um filme imprescindível. Todos os grandes poetas, pensadores, filósofos e profetas sempre se referiram à Natureza como algo sagrado.

O amor e o respeito pela Natureza é uma das mais marcantes características das mentes espiritualizadas — e com “espiritualizadas” não quero dizer necessariamente “religiosas”. A Bíblia diz: “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos.” (Samos 19:1). Em Sua Epístola a Napoleão III, Bahá’u’lláh (1817– 1892) escreveu: ‘Vede o mundo como o corpo humano, o qual,  embora inteiro e perfeito no tempo de sua criação, tem sido afligido, por várias causas, com graves males e doenças. Nem por um só dia obteve sossego; ao contrário, sua enfermidade tornou-se mais severa, pois foi sujeitado ao tratamento de médicos inábeis, que se entregavam inteiramente a seus desejos pessoais e erraram de um modo lastimável. […] Assim vos informa o Onisciente, a Suma Sabedoria’.

Qualquer pessoa que reflita sobre a condição atual do mundo há de reconhecer que ele realmente está muito doente, e nós mesmos temos sido a causa de suas enfermidades.

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