Valinhos

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Números constam de Relatório elaborado pelo Conselho Municipal dos Direitos da Mulher e mostram que município precisa de um plano urgente contra a violência de gênero

Relatório elaborado pelo Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (CMDM) e publicado na Imprensa Oficial do Município no último dia 15 de outubro aponta para o crescimento da violência contra a mulher em Valinhos. O estudo, em sua terceira edição, tomou por base os registros de Boletins de Ocorrências (BOs) na Delegacia dos Direitos da Mulher (DDM) e no Plantão da Delegacia, uma vez que a DDM funciona apenas em horário comercial, durante o primeiro semestre de 2023 (janeiro a junho).

De acordo com o estudo, foram analisadas 398 ocorrências registradas na DDM (166 BOs) e no Plantão da Delegacia (232 BOs). Deste total, 350 tiveram como vítima o gênero feminino, ou seja, 87,94% dos registros. Em média, 58 mulheres são vítimas de algum tipo de violência doméstica todos os meses em Valinhos, o que significa que quase duas mulheres diariamente sofrem violência doméstica.

Em 34 ocorrências, o gênero masculino aparece na condição de vítima, ou seja, 8,5% do total dos registros. Em outros 14 Boletins de Ocorrência (BOs), não foi registrado o gênero da vítima

O estudo mostra que, num universo de 166 ocorrências registradas na DDM, a maior parte delas — 89 BOs — refere-se a mulheres na faixa etária de 31 a 60 anos, correspondendo a 53,61% do total. O mesmo acontece com as ocorrências registradas no Plantão: de 232 BOs, 126 têm como vítima uma mulher na faixa de 31 a 60 anos, ou seja, 54,74%.

Na quinta-feira, dia 24, a Folha de Valinhos conversou com a Dra. Alexsandra dos Santos Parra, presidente do Conselho dos Direitos da Mulher, e com a terapeuta ocupacional Silene de Souza Gianechini, representante do Poder Público no CMDM, para entender um pouco mais a respeito do estudo que será apresentado na Tribuna da Câmara Municipal no próximo dia 19 de novembro, dentro da campanha “21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher”

Dra. Alexsandra ressaltou a importância do trabalho realizado por conselheiras e voluntárias do CMDM, mas acredita que há muito mais a ser apontado, uma vez que há muitas subnotificações, sobretudo em condomínios, onde, apesar de haver uma lei que determina que qualquer pessoa deva denunciar atos de violência doméstica, isso ainda é muito novo. “As subnotificações não aparecem no estudo; acreditamos que os números, que já são altos, possam ser ainda maiores”, disse.

A presidente do CMDM também acredita que um dos fatores que talvez tenha colaborado para o aumento do número de casos foram as campanhas de conscientização que são realizadas, pedindo que as mulheres denunciem os abusos domésticos e o fato de as mulheres terem tomado consciência de que a violência “moral e psicológica” também é uma violência doméstica.

“Nossa maior dificuldade no tocante à violência contra a mulher é criar em Valinhos um protocolo de atendimento. Não temos a definição desse fluxo de atendimento para saber onde começa e onde termina”, destaca. Para ela, é urgente que Valinhos tenha um centro de referência para que as vítimas possam ser encaminhadas. “Isso é de extrema importância, sobretudo no apoio psicológico às vítimas”, acrescenta.

Um dos pontos de partida nesse processo é a Delegacia da Mulher, que, no município, não tem uma delegada determinada para a função e que só funciona em horário comercial. “É fato comprovado que mulheres vítimas de violência se constrangem diante de um interlocutor do sexo masculino que a atende num momento de tanta dor”, disse.

A terapeuta ocupacional Silene de Souza Gianechini, que participou diretamente do levantamento, destaca que ele traz muitas informações importantes para a definição de políticas públicas que possam auxiliar no combate à violência contra a mulher, dentre elas a definição geográfica das regiões com maior incidência de agressão às mulheres em Valinhos.

A macrorregião IV, composta pelos bairros Capuava, Lenheiro, Jardim Jurema, Nações, Samambaia e Santa Cruz, é a que aparece com a maior incidência de registros, 18,23%, seguida da macrorregião I, formada pelos bairros CECAP, Espírito Santo, Fonte Sônia e São Pedro, com 17,15%.

De acordo com Silene, o Conselho da Mulher tem se valido dessas informações para levar a esses bairros a “Roda de Conversa”, refletindo com as mulheres sobre o “Ciclo da Violência” e a importância de seus empoderamentos, trabalho este desenvolvido em parceria com a Secretaria de Assistência Social, por meio dos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS).

“Ali ouvimos muito sobre ‘sobrecarga de trabalho, sobrecarga de tarefas, pouco espaço e pouca rede de apoio. Muita fragilidade emocional’. Em alguns casos, fica claro que a dependência econômica do parceiro é determinante para que ela se mantenha ou não no ciclo da violência. Em outros casos, mães com filhos têm que criá-los, cuidar da casa e não contam com o apoio do ex-parceiro”, explica.

Para a presidente do Conselho da Mulher, isso é apenas a ponta do iceberg da violência contra a mulher em Valinhos. “A mulher de Valinhos, quando se trata de violência doméstica, não tem uma referência. A referência dela são pessoas, e não uma instituição. Isso precisa mudar. Queremos efetividade em torno desse debate. Nosso grande desafio é ter uma conversa clara, disposição e vontade política”, disse. Dra. Alexsandra cobra das autoridades um compromisso mais realista com a situação que se apresenta.

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