Opnião

A integridade espiritual em meio à pandemia

Completamos nesta semana o quarto mês de restrições à convivência por conta da pandemia da Covid-19. Eu me recordo daquela segunda quinzena de março quando, de maneira muito abrupta, as escolas pararam de funcionar, os escritórios fecharam, as lojas de roupas suspenderam as vendas e até as igrejas fecharam as portas. Olhando agora, com uma pequena, porém relevante distância histórica, vejo o tamanho do golpe na nossa rotina. Tudo mudou repentinamente e, de um dia pro outro, paramos de nos abraçar, de nos tocar, de sentir o carinho dos amigos, de conviver comunitariamente.
Mas, afinal, de que modo a pandemia e essa mudança forçada nos nossos hábitos sociais impactam a nossa experiência espiritual e o modo com o qual nos relacionamos com Deus? São muitos os pontos a serem explorados aqui, mas desejo me ater mais detalhadamente a três: a lida de cada um com a própria consciência, o contato imediato e descontrolado com a morte e o risco da perda da esperança.
Certamente você, que agora lê estas linhas, já se pegou nesta pandemia perdendo a paciência com você mesmo(a). É natural que isso aconteça, afinal de contas o isolamento social e, para muita gente,  também a solidão dele derivada, nos leva a ter que passar mais tempo lidando com as nossas próprias manias, nossas inconsistências, nossos vícios, nossa inclinação ao mal que não desejamos fazer, nossa impotência diante do bem que precisamos e devemos fazer. Que dureza, não? Todavia, nossa fé nos ensina de que a misericórdia divina jamais decepciona. Que apliquemos a nós mesmos essa medida abundante de perdão a qual pedimos que Deus aplique sobre nós.
Tomar contato com o noticiário, especialmente nas primeiras semanas, era uma experiência aterrorizante – e ainda é para quem segue se indignando e se comovendo. A realidade da morte, a falta de controle sobre o vírus, o medo de ter contato com outras pessoas e passar ou receber a infecção… Tudo isso nos coloca diante da contingência dessa vida. Como lembrou o Papa Francisco, naquele célebre oração que fez na vazia Praça de São Pedro no dia 27 de março, a pandemia nos arrancou das nossas ilusórias seguranças e nos mostrou uma humanidade doente.
E aqui está o gancho para a terceira realidade: ao nos constatarmos fracos, inseguros, incapazes e sem controle sobre o que está ao nosso redor, estão diante de nós os riscos do relativismo e da incredulidade. Não nos esqueçamos que, se estamos vivos, não foi por nossos méritos ou por nossa vontade: a vida é dom de Deus! E, se assim cremos e percebemos, já temos a resposta sobre em quem devemos colocar a nossa esperança.
Cuidemo-nos! E permitamos, pelo amor, que Deus cuide também de nós.

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